Evolução e Gambiarra
Uma síntese de "Evolution and Tinkering" de François Jacob
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Evolução e Gambiarra
Com base no texto “Evolution and Tinkering” de François Jacob.
Como explicamos o mundo?
Da mitologia antiga à moderna ficção científica, nós vemos seres imaginários que apesar de irrealistas possuem vínculos e bases em animais e seres que nós conhecemos. A ideia por trás, que pode até ser inconsciente, é que a evolução em qualquer situação vai ser semelhante e gerar coisas semelhantes ao que nós conhecemos, mesmo que ocorra em situações completamente diferentes. É como nosso cérebro funciona ao organizar informações que podem não aparentar fazer sentido ou ter explicações. Não importa se o sistema de explicações tem como base a mitologia, a magia, ou mesmo a ciência, a idéia é “explicar o visível complexo através de algo invisível simples”, nas palavras do físico Jean Perrin.
A visão de mundo da Ciência
Seja através do mitológico ou científico, muito da visão humana sobre o mundo é construída com base na imaginação. Como dito pelo biólogo Peter Medawar, pesquisas científicas começam com a “invenção de um mundo possível ou de uma pequena parte de tal mundo”. Embora a mitologia comece da mesma maneira, é também aí que as semelhanças acabam. Para a ciência a imaginação é apenas uma parte da equação, sendo confrontada com a experimentação e o criticismo a cada passo do caminho. A ciência tenta confrontar o possível com o real.
A Hierarquia dos objetos
Através do desenvolvimento da ciência moderna, as áreas científicas se separaram e diversificaram, e se tornou cada vez mais difícil, ou quase impossível, encontrar verdades absolutas para todas as áreas. A única coisa que parece ser real para a maior parte das áreas é a hierarquia dos objetos, a ideia de que sistemas complexos são formados por coisas mais simples. Os objetos que existem a cada nível são limitados pelas possibilidades oferecidas pelo nível mais simples. A natureza funciona através da integração de cada nível observado. Organismos complexos são produzidos através do processo evolutivo por seleção natural, que é o resultado de duas limitações impostas a todos os seres vivos, a reprodução e as pressões seletivas do ambiente.
Engenharia e Gambiarra
A ação da seleção natural é comumente comparada à ação de um engenheiro, o que não poderia estar mais errado. Um engenheiro cria algo de acordo com um plano preestabelecido, com uma ideia finalista, e não é assim que a evolução e a seleção natural funcionam. Outra grande diferença entre a engenharia e a evolução é que a engenharia, quando bem praticada, utiliza materiais específicos para um projeto, com a finalidade de ser o mais perfeito possível. A evolução não é perfeita. A evolução funciona muito mais como um improviso, uma gambiarra, utilizando-se de coisas, materiais e sistemas preexistentes para dar origem a coisas novas imperfeitas e sem um objetivo final.
Evolução como gambiarra
A evolução funciona como um inventor de gambiarras, que durante éons e eras, modifica lentamente seu trabalho, retocando incessantemente, cortando aqui, alongando ali, aproveitando cada oportunidade para adaptá-lo a novos usos. A evolução não produz novidades do zero, ela trabalha com o que já existe, produzindo coisas novas e realizando novas funções ao transformar ou combinar coisas que já existem. Como um inventor de gambiarras poderia utilizar uma roda de bicicleta para criar uma roleta, a evolução faz uma asa de uma perna, ou uma parte do ouvido de uma parte da mandíbula.
Fonte: Jacob, F. 1977. Evolution and Tinkering. Science, 196 (4295): 1161–1166.